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Alta concentração da mídia ameaça liberdade de informação no Peru, afirma relatório do Ojo Público e do RSF

O Peru possui um alto nível de concentração da mídia, que ameaça a liberdade de informação no país, de acordo com relatório preparado pelo site de jornalismo investigativo peruano Ojo Público, em conjunto com o capítulo alemão da organização internacional Repórteres sem Fronteiras (RSF).

A concentração da mídia peruana é alta não apenas em termos da receita total recebida pelos grupos de mídia mais poderosos, mas também em termos de propriedade, audiência nos meios impresso e digital, e circulação, concluiu o relatório.

As três empresas de mídia que juntas dominam 84% do mercado peruano são o Grupo El Comercio, a ATV e a Latina. O primeiro tem mais de 60% da receita estimada do mercado de mídia.

A investigação no Peru faz parte do projeto Monitoring the Ownership of Media (MOM), nascido como iniciativa da RSF Alemanha, com financiamento do governo alemão. O projeto analisa estruturas de propriedade e o cenário legal da mídia em vários países das Américas, da África, da Europa e da Ásia.

O estudo foi baseado na metodologia do Centro para o Pluralismo e a Liberdade da Mída (CMPF), financiado pela União Europeia.

No Peru, entre setembro e novembro de 2016, a equipe analisou os 40 meios de comunicação peruanos de maior público (em impresso, digital, TV e rádio).

A análise concluiu que 70% da publicidade anual (em impresso, televisão e digital), 80% da circulação estimada de jornais e 78% dos leitores de jornais no mercado nacional são concentrados pelo Grupo El Comercio.

"A posição de mercado perigosamente dominante do Grupo El Comercio supera tudo o que temos visto até agora e representa uma grande ameaça ao pluralismo dos meios de comunicação", disse Christian Mihr, diretor executivo da RSF Alemanha.

O Grupo El Comercio - cujo jornal principal El Comercio, conhecido como o decano da imprensa peruana, foi fundado em 1839 - possui dois canais de televisão, nove jornais e 15 sites. Este grupo também possui um poder sem precedentes no mercado de mídia, explicou Óscar Castilla, diretor executivo do Ojo Público, em uma coletiva de imprensa sobre o projeto em Lima, no dia 1º de dezembro.

Um dos requisitos essenciais para a liberdade de expressão é a pluralidade de informações e de opiniões disponíveis ao público.

Por essa razão, o controle dos meios de comunicação em monopólios ou oligopólios - e a utilização de fontes únicas de informação para apresentar uma visão fragmentada e parcial da realidade nas esferas política, econômica ou social ou em qualquer outro campo de importância para a sociedade - constitui um sério obstáculo à difusão da reflexão crítica e coloca o direito do cidadão à informação em risco, disse Castilla durante a coletiva de imprensa.

Além de confirmar a predominância do Grupo El Comercio no mercado peruano, o Ojo Público também informou que o projeto MOM Peru revelou a falta de transparência dos grupos de mídia e a escassa regulamentação do Estado.

Quanto à televisão, o público também está concentrado em três grandes grupos: América (cujo acionista majoritário é o Grupo El Comercio), Latina e ATV.

No setor de rádio, a mesma situação de dominância nas mãos de poucos parece persistir. As dez estações de rádio mais importantes do país pertencem a quatro grupos: Corporación Universal, Panamericana de Radios, Grupo RPP e CRP. Os dois últimos têm sete das 10 rádios em questão, de acordo com o estudo.

Segundo o Ojo Público, ao contrário dos resultados dos projetos MOM em outros países, no Peru, os partidos políticos não estão por trás da propriedade de qualquer mídia privada em nível nacional. Dos dez grupos de mídia investigados, de acordo com o relatório, seis estão nas mãos de famílias.

"Embora não haja controle político direto sobre a mídia no Peru, existe um perigo para o pluralismo dos meios de comunicação decorrente de um vácuo regulatório", disse Mihr.

No entanto, segundo a análise, acionistas, membros da diretoria e executivos destes poderosos grupos de mídia, especialmente o El Comercio, a Latina e a ATV, têm laços estreitos com vários negócios no Peru, o que põe em perigo a independência da mídia.

O Ojo Público explicou que, embora a Constituição do Peru proíba o monopólio e a acumulação de meios de comunicação, a regulamentação que implemente essa regra é escassa. Os termos de propriedade são apenas definidos para os setores de televisão e rádio, disse.

“O Ojo Público, baseado nos dados do MOM, fez uma série de artigos investigativos sobre “Proprietários das Notícias no Peru,” contou Castilla ao Centro Knight Center para Jornalismo nas Américas.

Castilla afirmou que o Ojo Público conversou com o diretor jornalístico do El Comercio, Fernando Berckemeyer, e com outros diretores do grupo. Ao final da edição dos artigos da série, os entrevistados preferiram não responder a questões específicas relacionadas ao rendimento econômico, à identificação dos seus 168 acionistas, às empresas no exterior, à participação na Bolsa de Valores de Lima e aos anunciantes.

Em alguns casos, eles alegaram não responder ao Ojo Público porque estavam lidando com questões de confidencialidade. Castila informou que o El Comercio apenas forneceu números sobre a circulação de alguns de seus jornais.

Os outros grupos, ATV e Latina, assim como o resto da mídia estudada, não responderam a nenhuma pergunta, com exceção do jornal La República, que aceitou conceder entrevista com seu diretor e executivos, disse Castilla.

Em uma coluna editorial publicada no dia 24 de outubro de 2013, o jornal El Comercio fez sua primeira declaração sobre a controversa associação com o grupo Epensa, que levou à dominância do mercado peruano.

Em relação à posição dominante no mercado do Grupo El Comercio, a organização disse que isso se deve ao fato de que, nos últimos anos, o grupo tem sido capaz de desenvolver produtos inovadores (como os tablóides Trome, Perú21, Depor). O consumidor tornou-os líderes indisputados de seus respectivos segmentos, disse o jornal em relação aos seus produtos editoriais.

"O Grupo El Comercio tem a posição atual apenas por causa do trabalho e da graça da escolha do consumidor, que pode "concentrar" ou "desconcentrar" como quiser, em qualquer dia", disse o editorial.

Há onze anos, o grupo El Comercio detinha apenas 10% do mercado impresso, e 50% antes da associação com o Epensa, disse o editorial sobre a crítica do "acúmulo" de mídia nacional e da atual liderança no mercado.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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