O assassinato do premiado jornalista mexicano Javier Valdez, no dia 15 de maio, foi a gota d'água para o sindicato de jornalistas do país, considerado um dos mais periogosos para exercer o jornalismo no mundo.
A partir da morte de Valdez, que cobria o narcotráfico e o crime organizado e escreveu vários livros sobre os temas, os jornalistas do México e do mundo começaram a se organizar para pedir às autoridades mexicanas garantias para o exercício do jornalismo.
Hoje, depois de um mês do assassinato de Valdez, organizações, jornalistas e cidadãos realizam diferentes manifestações para honrar a memória do repórter de Sinaloa e um dos seis jornalistas mortos no México até agora em 2017. Além disso, jornalistas mexicanos e estrangeiros unem esforços para combater a violência contra a liberdade de expressão.
Mais de 50 meios de comunicação e instituições, entre eles Horizontal.mx, The New York Times en Español, Artículo 19, e a FNPI Gabriel García Márquez, criaram a iniciativa Agenda de Periodistas, que consiste na realização de seis workshops entre os dias 14 e 16 de junho na Cidade do México com o objetivo de definir ações para parar as agressões a jornalistas. A expectativa é que as conclusões resultem em um documento que será apresentado às entidades nacionais e internacionais encarregadas de garantir a liberdade de expressão.
No dia em que se completa um mês da morte de Javier Valdez, várias organizações convocaram meios de comunicação e jornalistas de todo o mundo a publicarem histórias relacionadas a Valdez ou à violência contra o jornalismo com as hashtags #OurVoiceIsOurStrength e #NuestraVozEsNuestraFuerza (Nossa Voz é Nossa Força, em inglês e espanhol).
"A inação e o fracasso do governo em proteger a imprensa colocam em risco não só os repórteres, mas também a liberdade de expressão e até a democracia do México. Como membros da comunidade internacional da imprensa, temos a oportunidade de enfrentar os jornalistas do México e exortar o governo mexicano a agir", se lê em uma carta assinada por vários jornalistas internacionais, publicada no site do Comitê para a Proteção de Jornalistas.
As hashtags acima mencionadas também reuniram denúncias de usuários de redes sociais e de jornalistas sobre a quase total impunidade que prevalece nos assassinatos de jornalistas no México. Muitos tweets desqualificaram a recompensa recentemente anunciada de 1,5 milhão de pesos oferecida pelas autoridades para obter informações sobre os assassinos de Valdez e outros jornalistas assassinados no México este ano. Muitos consideram isso um sinal do lento progresso das investigações.
O CPJ recordou também em suas redes sociais o Prêmio Internacional da Liberdade de Imprensa concedido a Valdez em 2011. Além disso, a organização realizou uma transmissão em Periscope na qual os dirigentes da organização recordaram a vida e o trabalho do mexicano.
Na imprensa, jornalistas dedicaram editoriais e relatórios especiais à situação de violência contra jornalistas. A jornalista mexicana Anabel Hernández publicou a primeira entrevista concedida pela viúva de Javier Valdez, Griselda Triana, que exigiu justiça do Estado mexicano e que o assassinato seja esclarecido.
"Javier não foi posto de joelhos para ser morto, é o governo mexicano que está sendo posto de joelhos pelo narcotráfico, a narcopolítica. É o governo mexicano que está sendo posto de joelhos porque eles comeram nas mãos do narcotráfico", disse Triana, que realizará uma coletiva de imprensa no dia 19 de junho na sede da Associação de Imprensa de Madri. A organização dará um reconhecimento póstumo a Valdez antes da 78ª edição dos Prêmios APM de Jornalismo.
A nível internacional, os meios de comunicação e as organizações de jornalistas também recordaram a morte de Valdez. O Centro Dart para Jornalismo e Trauma, da Escola de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade de Columbia, publicou "Impunity in Mexico: Remembering Javier Valdez" (Impunidade no México: lembrando Javier Valdez). O especial apresenta textos dos jornalistas Melissa del Bosque, Javier Garza, Michel Marizco, María Teresa Ronderos, Christopher Sherman e Marcela Turati sobre a relevância de Valdez e a situação do jornalismo no México.
A Unidade de Dados do jornal colombiano El Tiempo publicou um especial sobre os 126 jornalistas mortos no México desde 2000 e um mapa interativo com a localização das vítimas durante a presidência de Enrique Peña Nieto.
Mas os jornalistas não só usaram suas palavras para lembrar de Valdez. Alguns se organizaram para tomar as ruas de várias cidades para exigir justiça.
Ríodoce, jornal co-fundado por Valdez e no qual ele trabalhou até o dia de sua morte, convocou várias manifestações em Sinaloa, incluindo uma no Palácio do Governo de Culiacán.
Por outro lado, repórteres e ativistas convocaram os cidadãos a trazerem velas e fotografias de jornalistas mortos ou desaparecidos para a marcha #NoAlSilencio, que percorrerá as ruas da Cidade do México no dia 15 de junho até o Ministério Público Especializado em Atenção a Crimes Contra a Liberdade de Expressão (FEADLE).
Álvaro Delgado, jornalista mexicano da revista Proceso, protestou durante um evento em que discursava o presidente Enrique Peña Nieto. Ele segurou um pedaço de roupa que dizia em letras: "Basta de Sangre. #NiUnoMás" (Basta de sangue, nem um a mais).
Manifestações também foram convocadas em homenagem a Valdez em outros estados. Em Guerrero, onde sete jornalistas foram atacados em maio passado e um apresentador de uma rádio indígena foi baleado no dia 3 de junho, o Sindicato Nacional de Redatores de Imprensa liderou um protesto na Autopista del Sol, que liga a Cidade do México com o porto turístico de Acapulco.
No estado de Michoacán, no qual o jornalista Salvador Adame Pardo foi sequestrado há quatro semanas e continua desaparecido, repórteres e fotógrafos marcharam nas ruas da capital, Morelia, para exigir que se encontre Adame e se obtenha justiça para Valdez.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.