No ano da eleição presidencial da Nicarágua, que ocorre em 7 de novembro, o presidente Daniel Ortega implementou limitações cada vez mais rígidas à liberdade de imprensa – uma movimentação que, segundo os críticos, faz parte de uma campanha de anos para silenciar a oposição política de Ortega.
“É uma situação muito, muito terrível pela qual estamos passando na Nicarágua”, disse a jornalista nicaraguense Cindy Regidor, em uma entrevista coletiva sobre o país centro-americano e sua imprensa, realizada pelo Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ) e pela Foreign Press Association. “A essa altura, nossos colegas não estão mais colocando seus nomes em seus artigos, sem assinaturas, porque isso também representa uma ameaça, depois que dezenas de nós foram interrogados pelo Ministério Público como uma forma de nos intimidar.”
A liberdade de imprensa na Nicarágua está diminuindo desde 2018, quando as propostas de cortes na previdência social levaram a uma onda de protestos pedindo a renúncia do presidente. O regime sandinista de Ortega respondeu usando forças paramilitares contra seus cidadãos, um ato de repressão violenta que deixou centenas de nicaraguenses mortos. Os jornalistas que cobriam os protestos foram identificados pelo governo e submetidos a assédio físico e online, vigilância, batidas em veículos de notícias e, em alguns casos, prisão.
Na noite de 21 de abril, o caso mais letal contra um jornalista ocorreu quando Ángel Gahona foi baleado em Bluefields durante uma transmissão pelo Facebook Live. Ele estava cobrindo um confronto entre a tropa de choque e manifestantes.
Nos três anos que se seguiram, o governo da Nicarágua implementou várias medidas adicionais para coibir o jornalismo independente.
A polícia invadiu e ocupou a sede do meio de comunicação Confidencial em dezembro de 2018 e, em seguida, ocupou sua nova redação pela segunda vez em maio de 2021. As instalações de produção do canal de notícias da Nicarágua 100% Noticias também foram alvo de operações e tomadas em dezembro de 2018.
Durante esses anos, muitos jornalistas nicaraguenses foram forçados a se exilar.
Em outubro de 2020, líderes do partido sandinista aprovaram uma lei de crimes cibernéticos, também chamada de “lei da mordaça”. A legislação penalizou a publicação de informações falsas com multas e até quatro anos de prisão. A lei não especifica diretrizes para o que qualifica como informação falsa, deixando esse veredicto a critério do judiciário.
No mesmo mês, a Assembleia Nacional do país aprovou a polêmica “Lei dos Agentes Estrangeiros”, exigindo que todos os nicaraguenses que trabalham para “governos, empresas, fundações ou organizações estrangeiras” se registrem no Ministério do Interior do país. Isso inclui jornalistas que trabalham com organizações estrangeiras ou recebem financiamento internacional e correspondentes estrangeiros baseados na Nicarágua.
“Imediatamente para nós, eles dispararam o alarme”, disse Natalie Southwick, coordenadora do programa que cobre a América Latina e o Caribe para o CPJ, durante o briefing da organização. “Se você está recebendo financiamento de qualquer entidade fora da Nicarágua, você deve se registrar como um agente estrangeiro. Alguém como Ortega verá uma lei como essa usada com sucesso para aumentar a censura e limitar a expressão”.
A organização de liberdade de imprensa Fundação Violeta Barrios de Chamorro deixou de funcionar após a aprovação da Lei dos Agentes Estrangeiros, mas ainda assim era alvo do regime de Ortega. A ex-diretora da fundação e potencial candidata presidencial, Cristiana Chamorro, foi colocada em prisão domiciliar no início de junho, acusada de lavagem de dinheiro e má administração da fundação.
Chamorro não era a única na mira dos investigadores do governo.
María Lilly Delgado, a Univision correspondent based in Managua, was called to testify without notice in relation to the Chamorro investigation. When she arrived to give testimony— the 12th journalist summoned in less than a month— officials with the public prosecutor’s office stated her lawyer wasn’t allowed to accompany her to the interview.
María Lilly Delgado, correspondente da Univision baseada em Manágua, foi chamada para testemunhar, sem aviso prévio, sobre a investigação de Chamorro. Quando ela chegou para prestar depoimento – o 12º jornalista convocado em menos de um mês, funcionários do Ministério Público declararam que seu advogado não tinha permissão para acompanhá-la na entrevista.
“Dissemos a eles que entraríamos cada um com nossos advogados separadamente, mas eles insistiram que os advogados não poderiam estar lá porque estávamos lá como testemunhas. Eles disseram que se insistíssemos [na] presença de nossos advogados de defesa, a promotoria teria que nos mudar do status de testemunhas para réus”, disse Delgado, de acordo com um release da Associação Nacional de Jornalistas Hispânicos.
Em agosto de 2021, o jornal La Prensa, o único jornal impresso diário nacional remanescente da Nicarágua, anunciou que estava se tornando apenas digital porque o governo estava retendo seu material impresso. No dia seguinte, a polícia sandinista fez uma batida em sua sede.
A ausência de jornais impressos e a censura dos canais de televisão têm um impacto significativo na disponibilidade de notícias na Nicarágua – menos de 30% do país têm acesso à Internet.
“A Nicarágua é o segundo país mais pobre da América Latina. Venho de um bairro de baixa renda e eu era o único em todo o bairro, em todos os cinco quarteirões do meu bairro, que tinha acesso à Internet em casa”, disse o jornalista nicaraguense Yamlek Mojica durante uma coletiva do CPJ. “Então, as pessoas não têm nada para se informar. Há muito poucas opções para o povo da Nicarágua saber o que está acontecendo na Nicarágua se você for pobre, e muitas pessoas são pobres na Nicarágua ”.
Em agosto, a polícia prendeu o editor do La Prensa, Juan Lorenzo Holmann, sob a acusação de suposta fraude e lavagem de dinheiro. O jornalista Carlos Fernando Chamorro, diretor do meio digital Confidencial e filho do ex-presidente que derrotou Ortega em 1990, também foi acusado de lavagem de dinheiro menos de duas semanas depois de Holmann.
“Eles dizem que isso é porque estão conduzindo uma investigação sobre um suposto caso de lavagem de dinheiro, mas na realidade os interrogatórios são sobre quem são nossas fontes, como trabalhamos, como decidimos como cobrir as questões na Nicarágua, se estamos sendo pagos pela CIA”, disse Regidor, que trabalha para o Confidencial.
Jornalistas estrangeiros também enfrentaram bloqueios de estradas na Nicarágua nos meses que antecederam a eleição presidencial. Em junho, um repórter do New York Times não foi autorizado a entrar no país, apesar de atender a todos os requisitos legais e de saúde para entrar. O mesmo aconteceu com o jornalista francês Frédéric Saliba, do Le Monde, em outubro. Ele foi informado de que sua passagem aérea havia sido cancelada pela companhia aérea um dia antes de seu voo, por “motivos migratórios”, segundo o jornal francês. Em 28 de outubro, o Confidencial informou que uma equipe do jornal hondurenho El Heraldo foi expulsa do país após entrar por um posto de fronteira.
Ortega tem enfrentado condenação internacional –principalmente dos Estados Unidos, Canadá e União Europeia– devido à repressão de seu regime contra jornalistas e meios de comunicação independentes. O governo da Nicarágua refuta as acusações de repressão da imprensa, alegando, em vez disso, que está protegendo seus cidadãos de notícias falsas. A vice-presidente e porta-voz do governo Ortega, Rosario Murillo, chamou os jornalistas de “malvados” e “terroristas da comunicação” em uma entrevista à mídia estatal nicaraguense em junho de 2021.
“Esses [...] tagarelas, todos os dias, inventam qualquer coisa para semear o terror nas pessoas”, disse Murillo. “Se não é uma coisa, é outra, eles estão sempre instalando, querendo instalar o medo, e nosso povo sabe como eles mentem, como são maus, hipócritas, destrutivos, criminosos, terroristas e terroristas da comunicação também.”
No dia 1º de novembro, o Meta, do Facebook, anunciou que o governo da Nicarágua tem administrado uma fazenda de trolls desde 2018 para espalhar desinformação, difamar a oposição e elogiar o governo, como noticiou o Financial Times. No mês de outubro, a empresa disse que tirou do ar cerca de 1.500 contas, páginas e grupos no Facebook e Instagram.
Diante das eleições, o CPJ publicou uma lista de oito ameaças à liberdade de imprensa a serem observadas, incluindo prisão, operações nas redações, perseguição e vigilância policial, assédio judicial, assédio administrativo, autocensura, exílio e diminuição do acesso à informação pública.
Apesar da repressão contínua por parte do governo, muitos jornalistas nicaraguenses continuam fazendo reportagens sobre as próximas eleições.
"Mesmo as pessoas que se mudaram para outros lugares estão criando pequenos projetos que lhes permitem continuar reportando sobre o que está acontecendo na Nicarágua... há um compromisso realmente profundo de continuar contando as histórias do que está acontecendo na Nicarágua, mesmo além das fronteiras", Southwick disse.
"Vai ser muito difícil para os jornalistas cobrir o processo de votação em 7 de novembro, mas acho que, apesar de todos esses riscos, ainda vamos fazer isso", disse Regidor. "Só vamos ser muito cautelosos."
Glorie Martínez, a autora deste artigo, é aluna da Universidade do Texas em Austin. Ela concluiu esta nota como parte do curso "Reportando a América Latina".
Esta matéria foi escrita originalmente em espanhol e traduzida por Marina Estarque