texas-moody

Vários canais de notícias ficam sem sinal e outros sofrem ataques durante transmissão de protestos na Nicarágua

Vários canais de notícias de rádio e televisão na Nicarágua foram atacados ou sofreram interrupções de sinal durante a cobertura da onda de protestos que irrompeu em todo o país devido a uma reforma da Previdência proposta pelo governo do presidente Daniel Ortega.

Os diretores dos canais nicaragüenses CDNN 23, Canal 12, Canal 100% Noticias e Canal 51 denunciaram ter sido censurados com a interrupção do sinal a cabo enquanto cobriam as manifestações, informou El Nuevo Diario. A empresa que fornece o serviço de transmissão por cabo respondeu apenas que isso ocorreu devido a falhas técnicas temporárias.

A Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) informou em seu site que o diretor do 100% Noticias, Miguel Mora, denunciou que foi contatado pelo governo para deixar de cobrir os protestos com a ameaça de que seu sinal seria interrompido, o que afinal ocorreu.

Alguns canais conseguiram retomar sua transmissão em poucas horas e outros acabaram sendo retomados dias depois, como é o caso de 100% Noticias. Quando seu sinal retornou em 24 de abril, estava sem áudio, informou o meio por sua conta no Twitter.

Sobre a situação de violência e protestos em massa no país, o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) divulgou uma declaração em 22 de abril condenando a morte de manifestantes, muitos deles estudantes que a organização diz terem sido atacados por forças policiais e grupos paraestatais.

A agência também lamentou a morte do jornalista Ángel Eduardo Gahona, dono do meio local El Meridiano em Bluefields, que foi baleado na cabeça enquanto cobria as manifestações via Facebook Live em 21 de abril.

"Este ato criminoso representa uma escalada da violência que os jornalistas têm sofrido nos últimos dias, bem como a violação da liberdade de expressão representada no incêndio da estação da Radio Darío em León", disse o comunicado.

No dia 20 de abril, um grupo de pessoas que chegou em duas vans às instalações da Radio Darío quebrou a porta da estação, ameaçou o porteiro, jogou vários litros de gasolina dentro do rádio e disparou um morteiro que queimou tudo, inclusive a pessoa que o disparou, disse o diretor da emissora de rádio, Aníbal Toruño, segundo o jornal nicaraguense La Prensa.

Pouco depois, em 27 de abril, Toruño deu mais detalhes sobre o ataque à Radio Darío em uma coletiva de imprensa organizada pelo Cenidh. De acordo com Toruño, ele estava dentro da emissora de rádio com outras 11 pessoas, três delas jornalistas, quando aconteceu o ataque que deixou os escritórios da rádio em escombros.

"Foi um ataque terrorista que teve como objetivo acabar com a vida do diretor [da rádio] e também de todos nós que estávamos realizando a transmissão ao vivo [dos protestos]", disse ele.

Além disso, Toruño acusou o deputado da Frente Nacional de Libertação Sandinista e vice-presidente da Comissão de Paz da Assembléia Nacional, Filiberto Rodríguez, como responsável pelo incêndio em sua rádio, segundo o 100% Noticias. De acordo com o site de notícias, Toruño culpou a polícia nacional e o governo pelo que poderia acontecer com ele, sua família ou seus trabalhadores.

Rodríguez não respondeu imediatamente a um pedido de comentário do Centro Knight.

"Eu apelo à sanidade e razão do presidente Daniel Ortega, isso não pode continuar a acontecer na Nicarágua", disse o dono da Radio Darío, de acordo com 100% Noticias.

Quanto às investigações iniciadas pelo Ministério Público sobre o atentado contra a Radio Darío, a presidenta do Cenidh, Vilma Núñez, disse em entrevista coletiva que os órgãos judiciais do país "perderam a credibilidade, perderam o respeito que todo órgão judicial tem ter."

Em 30 de abril, o jornalista e dono da emissora Radio Mi Voz, Álvaro Moltaván, denunciou ameaças de morte contra ele e ameaças contra sua emissora, 100% Noticias publicou.

"Minha família e eu saímos de casa, estamos fora da rádio, até mesmo a rádio teve que sair do ar depois do que vimos com a Radio Darío", disse Montalván, segundo 100% Noticias. De acordo com o site de notícias, Montalván também relatou recente interferência de sinal em sua estação pela frequência da estação de rádio estatal Radio Ya.

Em uma coluna de opinião no site nicaraguense Confidencial, o jornalista Carlos Salinas disse que ataques a pelo menos 11 jornalistas e a "censura descarada" de quatro canais de televisão que foram removidos do ar pela Telcor, a agência reguladora de telecomunicações, são um "show da deriva ditatorial" do governo de Ortega.

De acordo com Confidential, os jornalistas que foram atacados "com brutalidade" pelos partidários do governo enquanto cobriam os protestos são: Julio López, Alfredo Zúñiga, René Cuadra, Carlos Herrera, Néstor Arce, Maynor Salazar, Ricardo Salgado, Róger Sánchez, Melissa Aguilera, Roy Moncada e Emilio Chamorro.

A CIDH e seu Relator Especial para a Liberdade de Expressão declararam em seu site que ataques contra jornalistas e a destruição de equipamentos daqueles que cobrem essas situações violam a liberdade de expressão, tanto individual quanto coletivamente. A entidade também se referiu à retirada do sinal dos canais de TV como uma forma de censura que viola o direito de uma sociedade de ser informada sobre assuntos de interesse público.

Além disso, a CIDH informou que solicitará ao governo de Ortega que permita uma visita de trabalho da entidade à Nicarágua para avaliar a situação.

Segundo dados da Cruz Vermelha da Nicarágua e grupos locais de direitos humanos, desde que os protestos começaram em 18 de abril, pelo menos 28 pessoas morreram, 435 ficaram feridas e 242 delas foram hospitalizadas, informou a Human Rights Watch.

No entanto, na última atualização sobre o número de mortos por Cenidh, é possível que 43 nicaraguenses tenham morrido até agora, segundo a CNN.

O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) divulgou um alerta de segurança e sugestões para jornalistas na Nicarágua reportando sobre violência ou multidões. Está disponível em inglês espanhol.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

Artigos Recentes