A mais recente edição do Índice Chapultepec de Liberdade de Imprensa e de Expressão nas Américas, da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, na sigla em espanhol), registrou uma melhoria de 4,2 pontos na média dos 22 países avaliados no continente. Em 2021, a média do indicador atingiu 55,6 pontos, contra 51,4 no ano anterior, numa escala de 0 a 100.
O panorama geral mais positivo vem com resultados ruins de três dos maiores países da região, Argentina, México e Brasil, que foram os que perderam mais pontos no ranking.
O pior resultado é o da Argentina, que perdeu 23,9 pontos e despencou 12 posições no ranking continental. O país havia sido classificado na segunda posição no ano anterior e agora está em 14º entre os países analisados.
“A prática do jornalismo na Argentina sofreu uma forte deterioração das condições durante o período em análise. A pandemia e a longa quarentena imposta pelo governo nacional serviram de desculpa em muitas ocasiões para coibir a liberdade dos jornalistas. A isto se acrescentam o lawfare instigado pelos mais altos níveis de governo, a criação de órgãos de controle para supostamente combater a desinformação, e a justiça como elemento de intimidação,” diz o relatório sobre o país.
Um relatório do Foro de Jornalismo Argentino (Fopea, na sigla em espanhol) já havia detectado um aumento de 41% nos casos de ataques a jornalistas no país em 2020. O índice da SIP cobre o período que vai de julho de 2021 a agosto de 2020.
“As eleições legislativas de 2021 [em 14 de novembro] podem enviar um sinal ao governo sobre a necessidade de moderar o discurso de confronto com a mídia jornalística. A moderação nas restrições decorrentes da pandemia permitirá retomar o curso normal do trabalho jornalístico,” analisa a SIP.
Já no México, a piora está associada ao recrudescimento da violência contra jornalistas. O país perdeu 5,8 pontos no índice da SIP e caiu cinco posições, ocupando a 16ª colocação. O relatório critica a falta de medidas concretas de proteção de jornalistas e garantias ao exercício da liberdade de imprensa.
Só em 2021, já foram assassinados sete jornalistas no país, segundo a Artigo 19, igualando o número de casos de 2020. Os casos mais recentes são os do fotojornalista Alfredo Cardoso, morto em 31 de outubro, e do diretor da revista Jovel, Fredy López Arévalo, em 28 de outubro.
Num caso emblemático, o diretor do site Noticias Minuto a Minuto e Panorama Pacífico TV, Gustavo Sánchez Cabrera, havia solicitado diversas vezes ajuda do Mecanismo Federal de Proteção a Jornalistas diante das ameaças que vinha sofrendo. Mas o suporte prometido não chegou a tempo e ele foi morto em 16 de junho.
“Os elevados níveis de insegurança que existem no país continuam a afetar o exercício do jornalismo e nota-se que algumas ações do ambiente executivo afetam negativamente o exercício da liberdade de expressão de jornalistas e outros atores políticos relevantes,” diz o relatório da SIP, em referência aos ataques provenientes do próprio presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador.
O relatório cita as mañaneras, como são conhecidas as entrevistas coletivas matutinas concedidas por Obrador na qual ele “desqualifica e estigmatiza os meios de comunicação, os jornalistas ... que criticam publicamente as ações do governo ou que apontam as suas omissões.”
De forma similar ao México, o Brasil perdeu 5,6 pontos no índice, mas manteve a 19ª colocação no ranking, à frente apenas de Venezuela, Cuba e Nicarágua. Segundo a SIP, o maior e mais populoso país da América Latina passa por um processo histórico de enfraquecimento das instituições democráticas, nas quais se incluem os meios de comunicação, que se acelerou com a partir das eleições de 2018.
Na ocasião, “o então deputado federal Jair Bolsonaro, na época do Partido Social Liberal (PSL), venceu a disputa com um discurso de viés autoritário, sendo a imprensa um de seus alvos preferidos de ataques e ofensas,” diz o relatório.
A SIP chama a atenção para a produção de e difusão de fake news e a disseminação de discurso de ódio na internet e destaca que, nos dois casos, grupos vinculados direta ou indiretamente ao presidente da República estão sendo investigados.
“A ação sistemática de grupos organizados para difundir a desinformação, controlar os fluxos de informação e incentivar a subversão da ordem democrática. A suspeita, sob investigação, da relação entre grupos deste tipo e o poder executivo. É neste contexto que devem ser vistas as ameaças do poder executivo e os episódios de agressão de Bolsonaro e seus aliados contra os jornalistas,” diz a SIP.
De modo oposto, o índice Chapultepec registra avanços significativos na liberdade de imprensa e expressão no continente. O maior destaque positivo é a República Dominicana, que ganhou 30,9 pontos no índice e passou da 14ª para a 4ª posição no ranking geral.
No país caribenho, o avanço está diretamente associado à mudança de governo ocorrida em agosto de 2020, com a posse do presidente Luis Abinader, do Partido Revolucionário Moderno, encerrando 16 anos do governo do Partido da Liberação Dominicana.
“Jornalistas críticos do governo derrotados nas urnas ... viram como as ameaças contra eles, feitas por funcionários e apoiadores do regime anterior, deixaram de ser um perigo para sua prática profissional. A renovação que atingiu a esfera congressional e parte do judiciário redefiniu o cenário da mídia do governo,” diz o relatório.
Jamaica, Equador, Bolívia, Estados Unidos e Panamá também melhoraram significativamente os seus indicadores de liberdade de imprensa, avançando pelo menos dez pontos cada um.
No topo do ranking, apenas dois países são considerados sem restrições à liberdade de imprensa e de expressão: Uruguai, que lidera o levantamento, e Chile, que vem logo a seguir. Os dois acumulam mais de 80 pontos no índice. No entanto, a SIP alerta para a precarização do trabalho de jornalistas uruguaios e a incerteza sobre o processo constituinte chileno como potenciais riscos a serem observados nos dois países.