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Nem toda a mídia foi cúmplice da ditadura, dizem jornalistas chilenos em rechaço a comentários do presidente

Nem todos os veículos de mídia foram cúmplices da desinformação em que a ditadura tentou manter o país, diz o presidente da Associação de Jornalista do Chile, Marcelo Castillon, em resposta a declarações feitas na última quinta-feira, 5 de setembro, pelo presidente Sebastián Piñera à imprensa estrangeira e antes ao diário local La Tercera.

O presidente chileno mencionou que, durante a ditadura, "a mídia poderia ter feito mais para ter investigado a realidade das violações dos direitos humanos, com mais rigor e profundidade, e não ter ficado com a versão oficial do governo militar".

Em entrevista ao diário La Tercera, Piñera disse que muitos eram "cúmplices passivos que sabiam e não fizeram nada ou que nem quiseram saber, tais como jornalistas que publicaram histórias sabendo que não correspondiam à verdade".

O presidente "não deveria ter generalizado, porque muitos meios de comunicação conseguiram romper o cerco e contar a verdade, como a Cooperativa, Rádio Chilena, revista Análisis, Apsi, Cause e Fortín Mapocho", diz Castillo.

Durante a ditadura, pelo menos 30 jornalistas que não eram cúmplices do governo morreram, como José Carrasco Tapia, editor da revista de oposição Análisis, que foi assassinado há 27 anos, na madrugada de 8 de setembro, por agentes do regime de Augusto Pinochet e encontrado no cemitério Américo Vespucio com 13 tiros.

"A ditadura procurou silenciar-nos, aterrorizar-nos, matar-nos", ressaltou Patricia Collyer, jornalista da Análisis e colega de 'Pepe' Carrasco, para quem a sua morte foi "um golpe mortal". Desde então, "fazemos as coisas com medo, mas não nos paralisou", disse Collyer ao diário Uchile.

No entanto, Castillo destacou que a Associação dos Jornalistas pediu desculpas publicamente em 2008. "Nós não fizemos tudo o que deveríamos ter feito, como jornalistas, nessas circunstâncias", disse Castillo, referindo-se ao período mais repressivo e violento na história do Chile.

Por outro lado, Edmundo Eluchans, presidente da Câmara de Deputados, classificou como "excessivas" as declarações de Piñera e acrescentou que "as críticas dirigidas aos juízes e à imprensa têm fundamento. Mas também um governo que vem pela força e suprime o Congresso, não tem juízes ou liberdade de imprensa".

Para Lorena Pizarro, presidente da Associação de Familiares de Presos e Desaparecidos, "os jornalistas desempenharam um papel crucial" na ditadura. Apesar da tortura, da marginalização, da repressão, havia meios de comunicação, imprensa e pessoas que se destacaram por publicarem a verdade do que aconteceu no país, mas isso teve custos impressionantes para eles, como a perseguição e o assassinato."

O dia 11 de setembro marca os 40 anos do golpe de Estado do Chile, que depôs o presidente esquerdista Salvador Allende, liderado pelo comandante do Exército Augusto Pinochet. Desde então, Pinochet estabeleceu um regime militar que durou 17 anos e deixou um saldo de mais de 40 mil vítimas, incluindo cerca de três mil mortos e pelo menos mil desaparecidos até o momento.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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