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Jornalista brasileiro é acusado de terrorismo após fazer reportagens sobre Estado Islâmico

O jornalista brasileiro Felipe Oliveira está sendo acusado pelo crime de promoção do terrorismo após ter se infiltrado em grupos simpatizantes do Estado Islâmico (EI) como parte de uma investigação jornalística realizada em 2016.

Segundo a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) reportou em 19 de abril, o juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, aceitou em fevereiro de 2018 denúncia do Ministério Público Federal (MPF) no Paraná. Segundo a denúncia, Oliveira “ultrapassou o limite do tolerável e promoveu a organização terrorista Estado Islâmico” em mensagens ao grupo.

No começo de 2016, Oliveira entrou em um fórum virtual usando um codinome para apurar os métodos de recrutamento de jovens pelo EI na Europa, afirmou a Abraji. O jornalista então passou a se comunicar com integrantes de grupos brasileiros simpatizantes do EI, como um interessado em se juntar a eles. A apuração rendeu reportagens para o jornal Folha de S.Paulo, publicada em março de 2016, e para o programa Fantástico, da TV Globo, veiculado em julho de 2016.

Oito participantes destes grupos foram presos na Operação Hashtag, realizada pela Polícia Federal brasileira na mesma época, conforme reportou o jornal Nexo. A operação tinha o objetivo de desbaratar supostas células terroristas que pudessem perpetrar atentados contra os Jogos Olímpicos que seriam realizados em agosto do mesmo ano no Rio de Janeiro.

A acusação assinada pelo procurador da República Rafael Brum Miron afirma que “o objetivo dele [Oliveira] talvez não fosse promover o terrorismo, mas por diversos momentos ele incentivou o ilícito”, diz o texto reportado pela Abraji. “O limite em uma investigação desse tipo é não incidir no crime que se está apurando”, escreveu o procurador.

A denúncia do MPF também afirma que Oliveira “deveria levar os fatos em apreço ao conhecimento da Polícia Federal assim que soubesse do cometimento de crimes”, segundo a Abraji.

O jornalista, no entanto, sustenta que desde o início da apuração esteve em contato com a Polícia Federal, repassando as informações que recebia nos grupos. Segundo ele afirmou ao portal R7, o primeiro contato com o grupo se deu em uma quinta-feira, e no sábado seguinte levou o material que havia recolhido à Polícia Federal.

Cumpri meu dever de repórter investigativo. Não houve nenhuma outra intenção que não fosse a de divulgar às autoridades e ao público a existência dessas organizações”, declarou Oliveira à Abraji.

O inquérito da Polícia Federal menciona que o jornalista “se apresentou na Superintendência Regional da Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro (SR/PF/RJ) e, espontaneamente, prestou declarações e apresentou seu smartphone à Polícia Judiciária”. No entanto, o delegado Guilherme Torres, na conclusão do inquérito, afirma que Oliveira “não teve a postura esperada de um jornalista, a qual deveria ser somente a apuração dos fatos e, em havendo crime, informar à autoridade competente”, reportou a Abraji.

Oliveira disse ao R7 que “confia na Justiça”. “Estávamos fazendo um trabalho puramente jornalístico, confiamos que a Justiça vai verificar e absolver, porque em momento nenhum quisemos promover terrorismo. Pelo contrário, tudo que sabíamos informávamos para as autoridades”, disse o jornalista.

Beno Brandão, advogado de defesa de Oliveira, disse ao R7 que a acusação contra Oliveira é “um ataque à liberdade de imprensa”. “É um caso claro para absolvição sumária. A procuradoria acha que ele deveria ter parado os contatos depois da matéria ter ido ao ar, mas ele só estava fazendo seu trabalho.”

Segundo o Nexo, a denúncia apresentada contra Oliveira tem como base a Lei Antiterrorismo (13.260/2016), aprovada às pressas pelo Congresso brasileiro e sancionada pela então presidente Dilma Rousseff antes dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro. O trecho em questão está no artigo 3º da lei, que proíbe “promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista”.

“A Abraji considera que a atividade jornalística de Oliveira não deve ser confundida com crime”, escreveu a diretoria da associação em nota. “Apelamos ao juiz federal Marcos Josegrei da Silva para que use a compreensão e o respeito que certamente tem pelo trabalho da imprensa para declarar Felipe de Oliveira inocente.”

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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