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Nova diretora do Artigo 19 do México e América Central busca gerar "empatia" por jornalistas

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  • 5 junho, 2016

Por Silvia Higuera y Teresa Mioli

A tarefa à frente de Ana María Ruelas, a nova diretora do Artigo 19 no México e América Central, não será simples. No local que é amplamente considerado um dos lugares mais perigosos para ser jornalista, ela lidera uma equipa que luta diariamente por liberdades básicas para comunicadores: acesso à informação, proteção contra danos corporais e garantias para se exercer livremente seu trabalho.​

Ruelas, que assumiu o novo cargo em 5 de maio, supervisiona uma equipe de 23 pessoas na Cidade do México e uma rede maior de consultores em todo o país. Ela é advogada e trabalhou anteriormente como oficial do Programa de Direito à Informação da Artigo 19.

Em conversa com o Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, Ruelas detalhou seus planos para continuar com o trabalho da organização, que prioriza trabalhar por leis que não restrinjam a liberdade de expressão ou o acesso à informação, e por garantias para proteger os jornalistas.

De acordo com Ruelas, quando a equipe da Artigo 19 vê propostas legislativas que dizem respeito à liberdade de expressão ou ao direito à informação, eles procuram participar do processo, seja diretamente na legislatura ou realizando ações legais ou políticas relacionadas com a lei.

Esta participação política ou jurídica consiste em recursos judiciais, ações de inconstitucionalidade contra instituições ou criação de alianças com outras organizações que trabalham para lidar com tais leis.

"A parte de análise e defesa legislativa é uma prioridade muito forte para a Artigo 19, mas é sempre desenvolvida em conjunto com outros grupos de organizações, por duas razões. Em primeiro lugar, acreditamos que a nossa voz por si só não vai levar a uma alteração legislativa, que é um problema, e, segundo, por uma questão de pluralidade em pensamentos e decisões que estamos promovendo," explicou Ruelas.

Mas, sem dúvida, uma das áreas que requerem uma grande quantidade de trabalho deste escritório é a proteção dos jornalistas. A organização registrou 397 ataques, incluindo sete assassinatos, de jornalistas em 2015. Mais ainda, a organização constatou que 46.9 por cento das agressões a jornalistas nos últimos sete anos foram cometidas por funcionário públicos.

A este respeito, como Ruelas observou, a organização documenta a realidade diária da imprensa do país. E apesar de haver um mecanismo de proteção federal para jornalistas e defensores dos direitos humanos, especialistas em liberdade de expressão, jornalistas e organizações multilaterais têm criticado repetidamente sua eficácia.​

De fato, a organização fornece medidas concretas de proteção, como são chamadas, incluindo a instalação de câmeras de segurança ou bloqueios nas casas dos jornalistas, ou fornecendo telefones celulares. No entanto, Ruelas é enfática em dizer que eles não são o Estado e que não podem assegurar a proteção de qualquer indivíduo. Por esta razão, outras medidas anteriormente adotadas no passado, como ajudar a transferir um jornalistas de uma cidade para outra, foram eliminados. A organização pretende se concentrar em garantir que o Estado cumpra sua obrigação de criar um mecanismo mais eficiente e reduzir os níveis de impunidade para os crimes contra jornalistas.

"Desde Darío, há cerca dois anos, decidiu-se apostar que o mecanismo iria funcionar", disse Ruelas, acrescentando que eles terão um papel ativo apenas em casos muito especiais, como quando um jornalista não confia no mecanismo.

"Realmente, o nível de agressão contra jornalistas não terminará enquanto o nível de impunidade não acabar", continuou Ruelas.

Ruelas disse, por exemplo, que houve um caso em que as câmeras, instaladas pelo mecanismo, mostraram um funcionário público agredindo uma jornalista; no entanto, nenhuma ação foi tomada contra o oficial. Por esta razão, ela está convencida de que, até que o problema da impunidade seja resolvido no país, os ataques não vai cessar.

Isto não impede a organização de trabalhar em projetos que ajudem a proteger os jornalistas. Um desses projetos é a campanha de mídia social #RompeElMiedo, iniciada há dois anos para monitorar a violência contra jornalistas e defensores dos direitos humanos durante os protestos na Cidade do México.

A rede de jornalistas foi reativada neste ano para a cobertura das eleições estaduais em 7 de junho e registrou 38 agressões contra a imprensa, incluindo agressões físicas, restrições de acesso à informação, roubo de equipamentos e muito mais. Além de documentar os casos, a organização fornece dicas sobre como documentar os protestos, reagir em caso de detenção arbitrária, manter contato com uma rede de comunicação, etc.

Outra área prioritária para a organização é o direito à informação. Com este tema, a organização se concentra em obter informações para populações vulneráveis ​​e gerar consciência pública sobre graves violações aos direitos humanos ou crimes contra a humanidade ocorridos no México nos últimos 60 anos.

Nesta área e sob diferentes apelos por proteção, a organização alcançou a desclassificação de informações de interesse público em diferentes casos. Um desses precedentes levou à abertura de informações sobre o caso Ayotzinapa, no qual 43 alunos da Escola Normal daquela cidade desapareceram em 2014.

Como parte de um dos maiores projetos da equipe, Memória e Verdade, eles estão trabalhando com organizações da sociedade civil e o Instituto Nacional de Acesso à Informação Pública. Através deste projeto, eles procuram divulgar toda a informação existente sobre 15 casos de violações dos direitos humanos. As informações serão divididas entre informações públicas, informações desclassificadas e arquivos da sociedade civil.

"A idéia é montar um quebra-cabeça de 15 casos de violações dos direitos humanos e estatísticas de crimes graves, como os desaparecimentos forçados, tortura, execuções arbitrárias, múltiplos homicídios e massacres," disse ela.

A organização também é conhecida por sua presença multimídia na internet, usando vídeo, infográficos e interatividade para explicar os desafios enfrentados pelos jornalistas do México. Seu alcance no país é amplo, como evidenciado em projetos que capturam depoimentos em primeira pessoa de jornalistas que foram atacados ou ameaçados.

Por exemplo, em seu web documentário "Estado de censura", de 2015, e no site interativo que acompanha o projeto (disponível em inglês e espanhol), a organização detalhou os casos de cinco jornalistas que têm enfrentado graves ameaças pelo seu trabalho. O projeto visualmente atraente, que incorpora vídeo e ilustração, levou os espectadores a Yucatán, Sinaloa, Veracruz, Cidade do México e até a Califórnia para ver como os jornalistas continuam seu trabalho.​

As reportagens e infográficos da Artigo 19 no México são amplamente compartilhados nas redes sociais e na imprensa tradicional, transformando a organização num termômetro para as liberdades de expressão e de imprensa no país.

No entanto, Ruelas disse que eles estão procurando maneiras criativas para contar essa realidade e produzir um impacto na sociedade sem usar imagens que sejam "tão agressivas." De acordo com a diretora, essa tática funcionou inicialmente porque as pessoas estavam acordando para essa realidade, mas agora "as pessoas estão muito cansadas de ouvir sobre a violência e de viver a violência."

Outra ideia que Ruelas tem é conseguir "empatia" para os jornalistas e a profissão. Para Ruelas, a organização tem sido muito eficaz em documentar as agressões, bem como conduzir iniciativas legais, mas eles não viram as pessoas defenderem a importância dos jornalistas como fontes de informação de interesse público e compreenderem o seu papel na democracia.

"A ideia é que as pessoas comecem a perder informações e, em seguida, comecem a sentir falta dos jornalistas, e comecem a encontrá-los necessários em suas vidas", Ruelas disse, acrescentando que ela vai saber que eles atingiram sua meta quando a sociedade protestar os assassinatos e desaparecimentos de jornalistas no país, tal como fizeram em Paris após o assassinato de jornalistas da revista Charlie Hebdo.

Embora Ruelas tenha chegado ao seu posto com novas ideias, ela disse que a essência da Artigo 19 será mantida.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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