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Violência contra a imprensa na Colômbia em 2022: pouco progresso em meio a ataques de grupos armados e de funcionários públicos

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  • 9 fevereiro, 2023

*Por FLIP (Fundação para a Liberdade de Imprensa), publicado originalmente na quinta edição de sua revista digital

 

Em 2022 presenciamos avanços judiciais para a proteção da liberdade de imprensa na Colômbia. No entanto, o jornalismo colombiano enfrentou uma violência crescente de grupos armados e um período eleitoral em que líderes políticos estigmatizaram os meios de comunicação e os jornalistas. No segundo semestre do ano, dois comunicadores foram assassinados, em Córdoba e Nariño. Este é um resumo dos principais fatos que marcaram a liberdade de imprensa na Colômbia em 2022.

1. Pico de ataques contra a imprensa de Arauca

No início de 2022, o departamento de Arauca viveu um pico de violência contra a imprensa. Na primeira semana, nove jornalistas foram perseguidos por grupos armados ilegais nos municípios de Arauca e Saravena. Mais tarde, em 19 de janeiro, um carro-bomba danificou a infraestrutura de dois meios de comunicação em Saravena. Além disso, nesse mês houve um aumento das pressões por parte de pessoas que se identificaram como integrantes das dissidências [das FARC, membros do grupo guerrilheiro que não aceitaram o acordo de paz] e da guerrilha do ELN [Exército de Liberação Nacional] para que os jornalistas publicassem informações como panfletos e ameaças. Ao longo do ano, as dissidências foram responsáveis ​​por 30 ataques à imprensa em Arauca e cinco realizados por guerrilheiros.

Esse aumento da violência se soma à tendência dos últimos três anos em Arauca: em 2020, foram registrados 13 casos; em 2021, foram 24 casos; e em 2022, 54 casos. Como consequência dessa violência, cinco repórteres foram forçados a deixar o departamento, que foi a única região em todo o país a registrar casos de deslocamento forçado de jornalistas durante 2022.

2. Greve armada

Durante a greve armada em seis departamentos decretada no início de maio pelo grupo criminoso Clan del Golfo, jornalistas de 12 meios de comunicação foram ameaçados e hostilizados. Em Bajo Cauca, Antioquia, duas rádios comunitárias foram obrigadas a transmitir um panfleto do Clã do Golfo e, diante da falta de garantias de segurança para os jornalistas desses meios, as seis rádios comunitárias da região decidiram deixar de transmitir até o ataque armado terminar. Em Montería, Córdoba, ameaçaram incendiar uma transmissora que atende seis estações de rádio em Córdoba, Sucre, Atlântico, Antioquia e Bolívar se ela não parasse de funcionar. A transmissora teve que ser desativada e as estações ficaram sem sinal por pelo menos quatro dias. Em Córdoba, um jornalista que estava fazendo uma cobertura ao vivo foi ameaçado e, como consequência, foi seguido por um homem que o intimidou com uma arma de fogo. Em Urabá, Antioquia, homens armados dispararam para o alto para obrigar dois jornalistas a pararem uma gravação.

 

Ilustración mujer periodista frente a computador, con libreta de notas y con micrófono

La existencia de violencia en línea contra mujeres periodistas en Colombia fue reconocida en una decisión judicial. (Ilustración: Rowena Neme / Cortesía FLIP)

3. Um período eleitoral violento

Entre janeiro e julho de 2022, a ONG colombiana FLIP [Fundação para a Liberdade de Imprensa] registrou 55 ataques à imprensa relacionados à cobertura das eleições presidenciais e legislativas. A agressão mais frequente foi a estigmatização, com 19 casos. Além disso, houve 11 obstruções a coberturas, principalmente nos dias das eleições e por parte de funcionários públicos. Além disso, a imprensa foi vítima de 12 ameaças e três casos de hostilidade relacionados à cobertura eleitoral. Os departamentos onde mais ocorreram esses ataques foram: Antioquia, Atlântico, Bogotá, Cauca e Magdalena.

4. Estigmatização contra a imprensa como fenômeno crescente e constante

A FLIP identificou que servidores e funcionários públicos utilizaram a estigmatização como uma forma de deslegitimar o trabalho de meios de comunicação contrários aos seus interesses e posições políticas, às vezes com o objetivo de agradar seus seguidores. Ao longo do período eleitoral, alguns candidatos sugeriram que a imprensa estava mentindo, associaram um setor da mídia a ideologias extremistas e lançaram acusações políticas que poderiam incitar a violência contra meios e jornalistas.

Dos 55 casos de estigmatização durante 2022, 36 foram realizados por funcionários públicos e, em alguns casos, seguiram um padrão de hostilidade, como o gabinete do prefeito de Medellín, onde Daniel Quintero Calle e seus funcionários mais próximos atacaram de forma persistente o jornal El Colombiano. Além disso, do total de estigmatizações, dez foram realizadas por parlamentares. Entre os reincidentes destacam-se: María Fernanda Cabal, Piedad Córdoba e Roy Barreras.

5. Ameaças a jornalistas no Darién

Em 6 de setembro de 2022, uma equipe de jornalismo da Telemundo foi vítima de ameaças quando cobria a rota de migração na floresta de Darién. Guias ilegais, também conhecidos como coiotes, os ameaçaram e obrigaram a sair do território. Disseram, inclusive, que vários jornalistas já tinham morrido ali. Quando o jornalista Daniel Muñoz estava em Capurganá, departamento de Chocó, três desconhecidos disseram que ele deveria ir embora imediatamente porque sua vida estava em perigo. Dias depois, já fora da área, Muñoz recebeu uma terceira ameaça por telefone. Três meses depois, o jornalista conta que não recebeu atendimento oportuno na ativação de mecanismos de proteção para seu caso.

Em áreas de fronteira, dois casos de ameaças de morte contra a imprensa por grupos ilegais foram relatados nos departamentos de ChocóLa Guajira. Nos três casos, as ameaças se repetiram e ocorreram depois que os jornalistas publicaram informações sobre a segurança pública e a atuação de grupos armados ilegais. Além disso, em dois casos, os autores das ameaças conhecem a residência e as rotinas dos jornalistas afetados, o que significa um maior risco e uma maior capacidade de ataque.

Montaje foto dos periodista uno con un micrófono y otro con una cámara colgada a su cuello

Rafael Moreno y Wilder Córdoba fueron los dos periodistas asesinados en Colombia en 2022 según registros de la FLIP. (Cortesía FLIP)

6. Assassinatos de jornalistas: Rafael Moreno e Wilder Córdoba

O jornalista Rafael Emiro Moreno foi assassinado na noite de 16 de outubro de 2022 em Montelíbano, departamento de Córdoba. Dois homens atiraram nele em um lugar de sua propriedade. Moreno era diretor do canal digital Voces de Córdoba e era amplamente conhecido na região por seu trabalho como líder comunitário e social. Moreno recebia ameaças desde 2019 e tinha um esquema de segurança da Unidade Nacional de Proteção. Até o momento não houve avanços significativos na investigação do crime.

O jornalista Wilder Córdoba foi assassinado na tarde de 28 de novembro de 2022, em La Unión, departamento de Nariño. Ele era diretor do canal comunitário de televisão Unión Televisión, onde trabalhava como jornalista havia mais de dez anos e era conhecido por suas denúncias jornalísticas e seu importante trabalho como fiscalizador e líder social. Até o momento não houve nenhuma declaração sobre as hipóteses da investigação e não se conhecem avanços significativos nesse sentido.

7. Responsabilidade do Estado no caso Edison Molina

O Tribunal Administrativo de Antioquia declarou a responsabilidade do Estado no caso do assassinato do jornalista Edison Molina [ocorrido em 2013]. O tribunal considerou que o Estado foi passivo diante da situação de risco relacionada às ameaças que o comunicador havia recebido e denunciado.

O tribunal ordenou que seja realizada uma cerimônia pública em Puerto Berrío, Antioquia, na qual a Polícia e o Ministério Público deverão apresentar pedidos de desculpas por não terem protegido devidamente a vida de Molina. No mesmo município também deverá ser realizada uma oficina, seminário ou palestra sobre direitos humanos, com especial destaque para a promoção e o respeito ao direito à liberdade de expressão, garantias de oposição e defesa dos direitos humanos.

8. Decisão judicial reconheceu a existência de violência online contra mulheres jornalistas

Tribunal Administrativo de Cundinamarca reconheceu que na Colômbia existe um padrão acentuado de violência nas redes sociais contra mulheres jornalistas. O tribunal estabeleceu que o Conselho Nacional Eleitoral e os comitês de ética podem sancionar partidos, movimentos e lideranças políticas por usar ou permitir esse tipo de violência que afeta a participação cidadã nos assuntos públicos. O caso está atualmente nas mãos do Tribunal Constitucional. Durante 2022, a FLIP registrou 44 ataques online contra mulheres jornalistas em várias plataformas digitais, principalmente nas redes sociais.

Periodista con audífonos frente a su consola de radio

En 2022 la FLIP interpuso una demanda de reparación por el asesinato del comunicador indígena Abelardo Liz ocurrido el 13 de agosto de 2020. (Foto original: Tejido de Comunicación ACIN / Montaje: Cortesía FLIP)

9. Ação contra o Estado pelo assassinato do comunicador indígena Abelardo Liz

Em outubro de 2022, a FLIP ajuizou ação de reparação direta contra o Exército e a Polícia pelo assassinato do comunicador indígena Abelardo Liz, ocorrido em 13 de agosto de 2020. Esta ação busca o reconhecimento da responsabilidade do Estado colombiano na morte do jornalista, pois a FLIP, como representante da família da vítima, conseguiu colher provas e depoimentos que confirmam que o Exército atirou em Liz quando ele cobria os confrontos entre as forças de segurança e a comunidade Nasa em Corinto, departamento de Cauca.

10. Ações do Congresso sobre a liberdade de imprensa

Em 2022, o Congresso fez progressos na defesa do direito de acesso à informação. Depois de quase dois anos e por pressão de diversos setores, o então presidente Iván Duque assinou a lei que restabeleceu os prazos das entidades para responder aos direitos de petição, que haviam sido ampliados durante a pandemia. Além disso, foi aprovado o Acordo de Escazú, que oferece mais garantias para o acesso à informação sobre questões ambientais. Por outro lado, foi iniciado o processo de criação de um fundo especial para a proteção da imprensa na Colômbia, em conformidade com a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Jineth Bedoya vs. Colômbia.

 

(Crédito da ilustração banner: Abriella Corker)

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