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Ministério Público da Colômbia ordena prisão de ex-pistoleiro e o vincula ao assassinato do jornalista Guillermo Cano Isaza

O Ministério Público da Colômbia ordenou a prisão de um ex-pistoleiro ao vinculá-lo com o assassinato do jornalista e diretor do jornal El Espectador Guillermo Cano Isaza, ocorrido em 1986.

Busto do jornalista Guillermo Cano Isaza no parque Bolívar em Medellín, Colômbia. A escultura foi feita por Rodrigo Arenas Betancur. (I, SajoR [CC BY-SA 2.5])
Busto do jornalista Guillermo Cano Isaza no parque Bolívar em Medellín, Colômbia. A escultura foi feita por Rodrigo Arenas Betancur. (I, SajoR [CC BY-SA 2.5])

Jhon Jairo Velásquez Vásquez, conhecido como 'Popeye', ex-chefe de pistoleiros do Cartel de Medellín, liderado pelo narcotraficante Pablo Escobar, está vinculado à investigação como suposto autor do crime de homicídio qualificado, disse a promotoria.

De acordo com um comunicado do Ministério Público, após o surgimento de novos testemunhos de outros ex-membros do cartel, bem como provas recolhidas, um promotor da Direção Especializada contra Violações dos Direitos Humanos ditou medida de segurança contra Vásquez. No comunicado, a entidade explicou que o caso contra ‘Popeye’ está sob o antigo sistema penal colombiano. Isso lhe permite impor a medida de segurança.

​​'Popeye' teria participado de uma reunião "em que os líderes do cartel de Medellín, incluindo Pablo Escobar, combinaram atentar contra Guillermo Cano Isaza por suas publicações contra a organização narcotraficante e definiram como e quem executaria o crime", disse ele a promotoria disse em um comunicado.

De acordo com El Espectador, em uma declaração de 28 de novembro de 2018, Vásquez, contradizendo declarações anteriores - segundo o jornal - negou ter conhecimento do ataque contra Cano Isaza e alegou ser inocente.

O ex-chefe de pistoleiros do Cartel de Medellín cumpriu pouco mais de 23 anos de prisão depois de se entregar às autoridades em 1991 e confessar ter cometido 300 assassinatos e participar em pelo menos outros 3.000, informou El Tiempo. Segundo o próprio Vásquez, ele coordenou 200 atentados com carros-bomba e participou dos assassinatos de Luis Carlos Galan (ex-candidato presidencial) e Carlos Mauro Hoyos (ex-procurador-geral), acrescentou o jornal.

No entanto, depois de nove meses em liberdade, Vásquez foi recapturado e está cumprindo uma sentença para o crime de extorsão na prisão de segurança máxima e média Valledupar, acrescentou. A recente ordem do Ministério Público foi informada ao Instituto Penitenciário e Carcerário (Inpec) para que "seja efetivado" assim que que 'Popeye' cumpra sua pena atual, disse o órgão.

De acordo com o Ministério Público, a outra pessoa vinculada com o crime é Gustavo Adolfo Gutierrez Arrubla, conhecido como 'Maxwell', que, segundo a entidade, "supostamente fez o trabalho de inteligência em Bogotá e identificou movimentos e rotinas do comunicador". As informações recolhidas por Gutiérrez teriam sido entregues ao grupo de assassinos que matou o jornalista, acrescentou.

Embora o Ministério Público tenha emitido uma medida não privativas de liberdade contra ele, Gutiérrez Arrubla deverá se apresentar regularmente a uma autoridade competente, não deixar o país, não ter nenhum contato com as vítimas e pagar um depósito equivalente a aproximadamente US$ 2.500, entre outras obrigações.

"Levamos 32 anos, desde 1986, à espera de justiça e de saber o que aconteceu. Esperemos que esta decisão sirva para chegar ao fundo de tudo", escreveram a esposa e os filhos de Cano em um comunidado, de acordo com a revista Semana. "Também queremos fazer um chamado de atenção à Comissão Interamericana de Direitos Humanos [CIDH] para seguir o exemplo do Ministério Público e nos ajudar a estabelecer a verdade sobre as circunstâncias, autores e contextos da morte de Guillermo Cano Isaza. A resposta que até agora tivemos desta importante instância internacional tem sido evasiva. O país precisa da verdade neste caso e nos de muitos outros jornalistas e colombianos inocentes".

Embora reconheça "a importância da decisão", a Fundação para a Liberdade de Imprensa (FLIP) a considera "tardia e não leva à concluir que o Estado colombiano cumpriu com a obrigação de investigar, julgar e punir esta grave violação dos direitos humanos".

"É desconcertante que a decisão adotada se baseie em provas que, em sua maioria, foram coletadas em 1993 e 1994. Isso mostra que o Ministério Público foi negligente em avaliar hipóteses de investigação presentes no expediente de mais de duas décadas atrás. Isso reforça a necessidade de uma observação internacional, especialmente da CIDH, sobre a responsabilidade do Estado neste caso", acrescentou a FLIP.

A FLIP também pediu ao Ministério Público para continuar a sua investigação para determinar se membros do Estado estavam envolvidos no crime, tanto na obstrução da investigação e como no julgamento.

Cano Isaza foi diretor do jornal El Espectador desde que tinha 27 anos até o dia de seu assassinato, em 17 de dezembro de 1986, com a idade de 61. Assassinos enviados pelo narcotraficante Pablo Escobar o balearam várias vezes na saída do jornal, de acordo com a publicação.

O diretor se caracterizou por suas constantes denúncias da máfia do narcotráfico em sua coluna "Libreta de Apuntes". No dia anterior à sua morte, em uma entrevista, Cano Isaza disse que sabia que algo poderia acontecer com ele, contou Ana María Busquets, viúva de Cano, a um especial da Unesco.

Após o assassinato de Cano, El Espectador seguiu sendo vítima da máfia. Na madrugada de 2 de setembro de 1989, um carro-bomba explodiu perto de suas instalações em um incidente que deixou 73 feridos. Além disso, alguns correspondentes em regiões foram assassinados, segundo Busquets, e até mesmo a sede de Medellín foi fechada no mesmo ano quando mataram os gerentes de administração e circulação naquela cidade, acrescentou o jornal.

Em 2010, o Ministério Público da Colômbia declarou o assassinato de Cano Isaza um crime contra a humanidade. Isso permite que o crime não prescreva, ou seja, evita que o tempo das autoridades para investigá-lo se esgote. No entanto, isso não significou necessariamente seu avanço. De fato, a FLIP observou que a recente decisão do Ministério Público é a primeira "relevante" desde 16 de janeiro de 2008, quando a investigação do crime foi retomada.

Até o momento só existem duas condenações por esse homicídio, segundo a FLIP. Uma contra Castor Emilio Montoya por ter sido o intermediário para contratar os assassinos que cometeram o assassinato, mas que nunca foi capturado, acrescentou a FLIP. Luis Carlos Molina Yepes foi condenado a 16 anos e 8 meses de prisão, embora sua sentença tenha sido reduzida para 6 anos. Da conta de Molina, chamado de banqueiro do Cartel de Medellín, foi gerado o cheque para pagar os assassinos, informou a FLIP.

O crime de Cano Isaza marcou a história do jornalismo na Colômbia e foi apontado pela Unesco como "representativo na medida em que aponta para a impunidade de crimes contra jornalistas". O Prêmio Mundial da Liberdade de Imprensa da Unesco leva o nome dele.

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