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Cartunista nicaraguense Pedro X. Molina recebe 'Reconhecimento de Excelência' do Prêmio Gabo de 2021

“O humor, em princípio, é sempre subversivo”, afirma Pedro X. Molina, cartunista de política do site jornalístico nicaraguense Confidencial. Ele acredita que os cartunistas latino-americanos têm "uma opinião política mais forte para dar".

Molina foi para o exílio em 8 de dezembro de 2018. Ele mora no estado de Nova York, longe da agitação da "big apple", mas também distante de sua Nicarágua natal, como muitos de seus colegas que foram forçados a sair de casa.

Caricaturista Pedro X. Molina, Nicaragua

O cartunista de política Pedro X. Molina, Nicarágua. (Cortesia)

Há poucos dias, no âmbito do Festival Gabo, um dos festivais de jornalismo mais importantes da América Latina, Molina recebeu o Reconhecimento de Excelência do Prêmio Gabo 2021. Segundo o Conselho de Administração da Fundação Gabo, Molina é um "exemplo extraordinário de combinação entre mordacidade e beleza, com um sentido muito verdadeiro e profundo dos grandes problemas de seu país". 

Os temas de suas caricaturas incisivas costumam ser os líderes de seu país, o presidente Daniel Ortega e sua esposa, a vice-presidente Rosario Murillo. No entanto, chefes de Estado da América Latina e do resto do mundo também não escapam da sua pena. Ele tem como alvo questões como pobreza, violência armada e corrupção política. Também fez desenhos comoventes sobre os mortos durante as manifestações de 2018 na Nicarágua.

Muitos jornalistas nicaraguenses independentes, como Molina, continuam a fazer reportagens sobre seu país do exterior. Depois das manifestações de massa iniciadas em abril de 2018 , como resultado de uma proposta irregular de reforma do sistema previdenciário, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, instalou um regime autoritário extremo no país e passou a perseguir, reprimir e prender todas as vozes críticas a seu governo.

 Molina disse à LatAm Journalism Review (LJR) que mais de 100 jornalistas independentes deixaram a Nicarágua desde 2018. "Na realidade, cem jornalistas independentes fora da Nicarágua é um número significativo."

Entre as várias medidas que ameaçam a liberdade de imprensa, ditadas nos últimos anos por Ortega, está o Decreto Presidencial 17-2021, publicado em agosto passado. O artigo 24 do decreto estabelece que todo prêmio ou condecoração internacional a um cidadão nicaraguense deve ser autorizado pelo governo, por meio do Ministério das Relações Exteriores, “para que a respectiva aprovação [seja] concedida em termos de reciprocidade”.

“Estou muito feliz que nenhuma das instituições, agências ou governos em todo o mundo tenha levado a sério essa coisa ridícula”, disse Molina.

Ortega e seu governo “achavam que com isso iam impedir que as vozes que estão falando sobre a Nicarágua, sobre o que está acontecendo lá, tivessem mais alcance no exterior, porque, ao evitar que ganhassem prêmios, fossem reconhecidas ou qualquer outra coisa, eles poderiam talvez tentar impor sua narrativa mentirosa do que está acontecendo desde 2018", disse Molina.

Molina é o primeiro cartunista a receber esse reconhecimento dos Prêmios Gabo desde o início da categoria, em 2013, e o segundo ilustrador a receber um prêmio institucional da Fundação Gabo, informou a organização.

Caricatura de Pedro X. Molina

Caricatura de Daniel Ortega, Presidente da Nicarágua, por Pedro X. Molina. (Cortesia)

 

A primeira impressão de Molina quando soube do reconhecimento foi de surpresa.

"Honestamente, eu não esperava por isso", confessou Molina. Disse ainda que se sentiu uma grande honra a nível pessoal e também pelo reconhecimento da caricatura como gênero do jornalismo.

“Que seu valor seja reconhecido, que seja reivindicado, me parece importante”, disse Molina, ao considerar a difícil situação que vive o jornalismo independente na Nicarágua.

É um reconhecimento “desse jornalismo de resistência que estamos fazendo”, enfatizou.

Molina colabora para o site de cartuns de política dos Estados Unidos, Counterpoint, além de continuar trabalhando para o Confidencial.

O fundador do Confidencial, o jornalista Carlos Fernando Chamorro, que também foi forçado a deixar a Nicarágua duas vezes por sua segurança, disse no Twitter que este reconhecimento de Molina “enaltece o jornalismo do Confidencial e incentiva a imprensa que resiste às ditaduras na Nicarágua, Cuba e Venezuela."

Chamorro disse à  LJR que Molina trabalha como cartunista para o Confidencial desde 2014, onde publica uma charge diária e um quadrinho semanal, além de retratos e ilustrações especiais e colaborações animadas para programas de sátira política na televisão.

“Pxmolina tem sido, há duas décadas, o jornalista mais eficaz da Nicarágua em expor as contradições e abusos do poder político, econômico e religioso”, disse Chamorro. “A sua capacidade de ilustrador, artista e cartunista, de traduzir, sugerir e interpretar o que os outros não conseguem ver, em poucos traços de desenho, em poucas palavras, e às vezes sem nenhuma palavra, resume a eficácia do seu trabalho.”

Em dezembro de 2018, uma operação policial expulsou jornalistas do Confidencial de sua redaçãoconfiscando a propriedade. Operação policial semelhante ocorreu novamente em maio 2021, na sede provisória onde a redação operava desde 2019.

Eles não vão nos calar, podem roubar outras câmeras de televisão, outros acessórios, podem ocupar um local onde fizemos algumas produções, mas vamos continuar reportando, não vão calar nossos jornalistas, disse Chamorro, pelo Twitter, após o segundo ataque, conforme publicado pelo El País.

Na opinião de Molina, a comunidade internacional não está tem estado à altura da situação desde que os nicaragüenses saíram às ruas em abril de 2018, “colocando suas gargantas e peitos” em risco para defender a democracia do país. E essa situação, segundo ele, é uma “voz de alerta” para toda a região.

“Um dos alertas que eu estava fazendo – e não só eu, muitos jornalistas independentes –desde 2018, é que se deixassem que o Ortega fizesse o que está fazendo até agora com impunidade, isso ia incentivar todos os autoritários que estavam de cabeça baixa na América Central a começar a replicar seu comportamento, porque iam ver que não haveria consequências a pagar", disse Molina. A mesma situação está ocorrendo agora em Honduras, El Salvador e até na Guatemala, acrescentou.

Esta matéria foi escrita originalmente em espanhol e traduzida por Marina Estarque

 

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