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Dono do jornal chileno El Mercurio admite ter feito contato com a CIA antes do golpe contra Allende

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  • 11 outubro, 2013

Por Travis Knoll

Agustín Edwards Eastman, proprietário dos diários chilenos El Mercurio e La Segunda, admitiu na semana passada ter se reunido com o então diretor da CIA Richard Helms e o assessor de Segurança Nacional dos EUA, Henry Kissinger, após Salvador Allende ter sido eleito presidente do Chile, segundo The Santiago Times. A declaração foi feita durante o julgamento que investiga as possíveis atividades ilegais cometidas pelos meios de comunicação que contribuíram para o golpe de Estado de 1973, o que aumenta o nível de vigilância que El Mercurio tem recebido durante anos sobre seu papel durante a ditadura de Augusto Pinochet.

Apesar dos vínculos entre a classe empresarial do Chile e os Estados Unidos não serem novidade, a polêmica atual se centra nas discrepâncias entre o testemunho de Edwards e os documentos dos Arquivos de Segurança Nacional recentemente tornados públicos, que mostrariam uma relação muito mais estreita que a descrita por Edwards.

Segundo o testemunho, transcrito por El Mostrador, Edwards viajou aos Estados Unidos em 5 de setembro de 1970, um dia depois da eleição de Allende. Em resposta à pergunta da procuradoria sobre a reunião "urgente" que teve com Nixon e o diretor da CIA, Edwards respondeu que sua viagem teve como motivo visitar o presidente da Pepsi, Donald Kendall. Durante o encontro, contou, Kendall recebeu uma chamada de Nixon – que havia sido advogado da Pepsi – e comentou sobre a visita de Edwards. Segundo a versão de Edwards, Helms o contactou depois para marcar uma reunião com Kissinger. Ele negou ter falado com o presidente Nixon, e afirmou que só comentou sobre a vitória “comunista” no Chile, mas nunca falou de um potencial golpe.

Ao ser questionado sobre o temor de El Mercurio de perder verbas publicitários durante a fuga de capitais estrangeiros na época de Allende, Edwards respondeu que desconhecia esse aspecto, já que sua busca de trabalho nos EUA o impedia de seguir muito de perto todas as atividades do jornal. Que devido a ameaças contra sua vida, ele não voltou ao Chile até 1975.

De acordo com Peter Kornbluh, diretor do projeto de documentação do Chile do Arquivo de Segurança Nacional dos EUA, os documentos que antes eram confidenciais e agora são públicos dizem o contrário. Em uma entrevista ao El Mostrador, o historiador disse que os documentos mostram que Edwards ajudou a "facilitar o caminho" para o golpe. Acrescentou que El Mercurio recebeu milhões da CIA para publicar artigos com o objetivo de "sufocar a esquerda" no Chile. Os documentos também mostram que a relação entre Edwards e a CIA se remonta à década de 1960, quando ambos se opuseram a uma anterior candidatura eleitoral de Allende.

Edwards é acusado de "(apoiar) abusos ilícitos contra os direitos humanos", segundo o jornal chileno La Tercera. O julgamento, que se iniciou com uma ação em janeiro deste ano pela Agrupación de Familiares de Detenidos Desaparecidos (AFDD) e a Agrupación de Familiares de Ejecutados Políticos (AFEP), foi considerado pela Promotoria como "o julgamento mais importante da história do país", segundo Proceso.

As confissões de Edwards surgem depois das polêmicas declarações do presidente chileno Sebastián Piñera, que acusou os meios de comunicação de terem sido "cúmplices passivos" da ditadura. Em 2008, o Sindicato de Jornalistas do Chile pediu desculpas por "não ter feito o suficiente" como oposição durante a ditadura de Augusto Pinochet, que durou trinta anos (1973 – 1990).

Alguns acusam o El Mercurio de encobrir abusos aos direitos humanos durante o régime militar. Segundo o portal de notícias chileno Cooperativa, Edwards omitiu todos os comentários sobre a linha editorial do El Mercurio em suas declarações.

Contudo, durante o julgamento, Edwards agradeceu ao governo militar. "Devo esclarecer que o governo militar salvou minha vida. Entretanto, não é correto [afirmar] que dei instruções de publicar ou não as informações sobre direitos humanos".

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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