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Violência, impunidade e desconfiança fazem do estado de Veracruz um dos lugares mais perigosos para ser jornalista no México

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  • 8 novembro, 2016

Por Josefina Mancilla

O estado mexicano de Veracruz provou ser um dos lugares mais perigosos do mundo para a imprensa, com 17 homicídios de jornalistas nos últimos seis anos. Apenas em 2016, três jornalistas foram mortos na região.

Com a notícia recente da demissão do ex-governador de Veracruz, Javier Duarte de Ochoa, e de sua subseqüente fuga da justiça, a imprensa tem destacado os perigos no estado, não apenas para os cidadãos comuns, mas também para jornalistas e profissionais da área de comunicação. Duarte, que enfrenta acusações de corrupção, assumiu o cargo em 2010. Sob sua administração, 17 jornalistas morreram e cinco desapareceram, de acordo com o Artículo 19 México, organização de direitos humanos com sede na Cidade do México.

Em agosto, o jornalista Noé Zavaleta foi forçado a deixar Veracruz após ter sido hostilizado e ameaçado pela publicação do livro "O Inferno de Javier Duarte: Crônicas de um governo fatídico". No entanto, organizações estatais como a Comissão Estadual para Atenção e Proteção dos Jornalistas (CEAPP) foram criadas para proteger os jornalistas destes tipos de perigos.

No Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas, 2 de novembro, a CEAPP intimou "todas as autoridades a continuar implementando medidas concretas para prevenir atentados contra jornalistas, garantindo que os responsáveis ​​sejam levados à justiça e assegurando o direito das vítimas à plena reparação".

Porém, Leopoldo Maldonado, diretor de proteção e defesa do Artículo 19 México, disse ao Centro Knight que os jornalistas muitas vezes são ameaçados se pedirem ajuda, ou têm medo de retaliação e, por isso, não se aproximam de organizações como a CEAPP.

“Há uma grande desconfiança”, disse Maldonado. Pelo fato de a CEAPP ser uma comissão do estado de Veracruz, "falta independência do poder executivo, neste caso, o governo do Estado."

Ele afirmou que "é preciso haver uma comissão de direitos humanos com autonomia do governo", pois muitas vezes são os laços estatais que mantém as investigações paradas.

"Não há conseqüências legais", disse ele. "As investigações simplesmente não avançam."

Em alguns casos, Duarte acusou os jornalistas de colaborar com grupos criminosos "citando, na maior parte, provas circunstanciais difíceis de comprovar", disse Carlos Lauría, coordenador sênior do Programa das Américas do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) ao Centro Knight. Essas acusações "persistentes" muitas vezes fazem com que os assassinos continuem em liberdade. Nos casos que avançam, parece haver irregularidades no processo judicial, disse Lauría.

"A impunidade em Veracruz é moeda corrente", explicou Lauría. "Apesar das declarações do ex-governador de que existia um sistema judicial funcional, a realidade é que Veracruz, com a quantidade de assassinatos de jornalistas desde a ascensão de Javier Duarte, é um dos lugares mais letais para a imprensa em todas as Américas".

Em um caso importante no ano passado, Rubén Espinosa, fotojornalista que fugiu de Veracruz, foi encontrado morto na Cidade do México, junto com quatro mulheres. De acordo com o Artículo 19, esta foi a primeira vez que um jornalista foi morto no Distrito Federal, região geralmente tida como um refúgio seguro para a imprensa.

Mais recentemente, em julho, Pedro Tamayo Rosas, correspondente do El Piñero de la Cuenca e de outros veículos, foi baleado várias vezes diante de sua esposa e filhos na frente de sua casa. Tamayo estava sob proteção do Estado desde janeiro.

Outro caso desse ano é o da jornalista Anabel Flores Salazar, que foi encontrada morta no dia 9 de fevereiro em Puebla, após ter sido sequestrada de sua casa em Veracruz no dia anterior. Como Rosas, Salazar cobria o crime organizado da região.

Apenas alguns meses depois da morte de Salazar, o jornalista Manuel Torres González foi morto a tiros no dia 14 de maio no norte de Veracruz. Torres nunca havia pedido proteção estatal.

Maldonado observa que são casos assim que mantém os jornalistas desconfiados para pedir proteção.

“Nós precisamos limpar a polícia, punir e limpar”, adicionou Maldonado. “Eles praticamente trabalham para as redes criminosas; tudo isso passa por um processo político”.

Muitos jornalistas que enfrentam ameaças e agressões, como Tamayo Rosas, trabalham nas editorias que cobrem casos de polícia e política, segundo o Artículo 19. Rosas escrevia sobre desaparecimentos, sequestros, execuções e notícias relacionadas a cartéis.

Uma vez que jornalistas não costumam se aproximar de organizações como a CEAPP para pedir proteção, Maldonado disse que muitos criaram redes de apoio entre colegas, ainda que haja uma desconfiança social mesmo entre a categoria. Ele adicionou que “o que muitos fizeram foi apenas parar de falar sobre tópicos delicados, o que é trágico”.

O Artículo 19 observou que, desde 2000 até o dia 3 de maio desse ano, foram 93 mortes de jornalistas no México - as últimas 20 sob a administração do Presidente Enrique Peña Nieto. Além disso, a organização noticiou em agosto que, de janeiro a junho, 218 ataques contra jornalistas foram registrados, 28 deles em Veracruz.

Lauría acrescentou que, ainda que Peña Nieto tenha feito reformas constitucionais nos processos de investigação de ataques contra jornalistas, elas não mudaram a situação.

“Além da retórica do presidente, que afirma que o governo mexicano respeita e está comprometido com a liberdade de expressão, ele ainda precisa percorrer uma longa distância para poder basear suas palavras em ações”, disse Lauría, concluindo que a situação em Veracruz coloca a democracia em risco.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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